Um Domingo de Ramos diferente para uma Semana Santa diferente

Uma Semana Santa diferente, aberta por um Domingo de Ramos diferente e precedido por uma Quaresma diferente, de modo especial de sua metade em diante. Desta vez, os ramos não estão em nossas mãos, mas fixados nas fachadas e janelas de nossas casas e apartamentos. Não vamos nos reunir à porta de nossas igrejas nem caminhar para dentro do templo recordando a entrada solene de Jesus em Jerusalém. Sem “Hosana Hey!”, sem “Hosana ao Filho de Davi!”. Jerusalém, desta vez, será nossa casa, onde Jesus deveria ser sempre convidado a entrar e habitar.

Ali, com Ele e com os nossos mais próximos, vamos viver as bênçãos, as contradições de cada passo do Tríduo Pascal. Vamos nos dispor a aprender com o Mestre a depor os mantos de nossos orgulhos, autossuficiências e egoísmos para vestir o avental do Lava-Pés doméstico, todo mundo se ajudando e se cuidando mutuamente. “Ninguém solte a mão de ninguém”, pelo menos no compromisso e na solidariedade, já que fisicamente a recomendação é para não darmos as mãos.

Nesta mesma “Jerusalém caseira”, teremos de lidar com o absurdo e o paradoxo de mandarmos crucificar aquele mesmo a quem poucos dias atrás aclamamos como Rei. É a Paixão de Cristo que se atualiza no grito surdo dos sofrimentos silenciosos que muitos de nossos irmãos e irmãos enfrentam no seio do local que deveria ser seu porto seguro. As chicotadas do carrasco sobre as costas doloridas do Senhor se atualizam na solidão de idosos abandonados, na violência doméstica sofrida por tantas mulheres, na panela vazia do chefe de família que não tem o que comer para si e para seus filhos, na situação insalubre e desumana a que tantos estão submetidos pela falta de água, luz, saneamento, pela falta de moradia. Cada gesto de egoísmo, intolerância e desumanidade que praticamos é uma martelada seca e dolorosa no cravo que dilacera a carne de Cristo sobre o madeiro da cruz.

Seguindo com o Mestre, perceberemos sua presença solidária e silenciosa no sepulcro das tantas incertezas que temos vivido dia a dia. O silêncio de tantas perguntas sem resposta que brotam no profundo de nossos corações: “Quando tudo isso vai passar? O que será de nós daqui para frente?” Nesta hora, não adianta a pressa. As respostas vêm num ritmo que não é nosso e não depende de nós. É hora de fazermos coro ao grito de Cristo: “Eu me entrego, Senhor, em tuas mãos”.

Tal situação, humanamente difícil de ser suportada, adquire um sentido de esperança quando com ela lidamos a partir da lógica da Ressurreição. Mais do que nunca esta Páscoa vem nos ensinar que esperança verdadeira não é necessariamente a certeza de que tudo vai dar certo ou sairá conforme planejamos, mas a capacidade que Jesus nos oferece de conferir a tudo o que nos acontece um verdadeiro sentido pascal, enxergando no horizonte a luz da vida e da Ressurreição.

Frei Gustavo Medella

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