Passageiros para a vida plena

 

“A vida é tão curta”. Isso é senso comum. Jamais se ouve o contrário. No Brasil, ela tem se tornado especialmente curta para nascituros, impedidos de nascer; para crianças, por desnutrição e diarreias; para adolescentes desencantados; para jovens, especialmente “afros”, assassinados até mesmo por Forças de Segurança; para trabalhadores acidentados; para vítimas do álcool no trânsito; e para idosos desprotegidos. São vidas “ceifadas antes do tempo”.

O que significa festejar a “Páscoa” neste país com potencial para qualidade de vida e longevidade, preso, no entanto, nas “malhas da morte”? Seus problemas são sistêmicos. Não lhe bastam reformas, sobretudo as que pioram a situação econômica, social e educacional, como vem ocorrendo nos últimos anos, com promessas enganadoras. Sem transformações sensatas continuaremos comprando passagens para o “vale da morte”, pagando caro.

Neste mundo, somos, sim, passageiros, mas com destino à vida plena. Cristo, o Filho de Deus que adquiriu condição humana, assim concebeu sua missão: “Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância” (Jo 10,10). Ele se fez luz para os humanos que, por fim, amaram mais as trevas (cf. Jo 3,19), rejeitando-o e matando-o. “Aquele que conduz à vida, vós os matastes, mas Deus o ressuscitou dos mortos, e disto nós somos testemunhas” (At 3,15).

A vitória de Cristo sobre o sistema que o aniquilou e sobre a própria morte, anunciada assim pelo apóstolo Pedro, é o testemunho que nós, cristãos, damos hoje, festejando a Páscoa em seu verdadeiro sentido. Na Páscoa de Cristo celebramos nossa própria páscoa, pois, nele nos tornamos novas criaturas. Somos vocacionados à revelação plena dos filhos e filhas de Deus (cf. Rm 8,19). Por isso, cremos que “os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a glória que há de ser revelada em nós” (Rm 8,18).

Vivemos, ainda, em condições desumanas. Estamos nos destruindo, aniquilando a vida do planeta, nossa “Casa Comum”. A mortalidade infantil volta a crescer. Portas para o trabalho digno se fecham. Serviços públicos são sucateados. Indígenas, afrodescendentes e outros são discriminados. A violência dissemina-se, também em instituições do Estado. Clamores de oprimidos são reprimidos.

Qual canto nos inspira neste tempo de desencantos, senão o de esperança em Cristo, vencedor do pecado e da morte? Quem nele crê, ainda que tenha morrido, viverá (cf. Jo 11,25). Confiemos, portanto, em Cristo Ressuscitado! Ele nos encoraja: “No mundo, tereis tribulações, mas tende coragem! Eu venci o mundo” (Jo 16,33); “Como o Pai me enviou, eu também vos envio” (Jo 20,21).

Vocacionados à revelação plena de nossa filiação divina, devemos, pois, ser luzes para os destinos do mundo, especialmente de nossa nação, por meio de nossa participação ativa na elaboração e implementação de políticas públicas, conforme nos propõe a Campanha da Fraternidade deste ano, sob o lema: “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is 1,27).

Alertando-nos que os filhos deste mundo são mais espertos que os filhos da luz (cf. Lc 16,8), Cristo exorta-nos a sermos lúcidos e autênticos em nossa fé, assumindo com coragem a missão libertadora e humanizadora que ele nos confia! Que a luz de Cristo brilhe, então, em nossos corações e em nossas ações! Feliz Páscoa, em Cristo Ressuscitado! Aleluia!

 

Dom Reginaldo Andrietta

Share on facebook
Share on twitter
Share on telegram
Share on whatsapp
Share on email
Share on print